Eleição terá dois candidatos ligados à lista suja do trabalho escravo

Leandro Prazeres

Do UOL, em Brasília

A relação dos candidatos às eleições deste ano inclui os nomes do sócio de uma empresa e de um fazendeiro que aparecem na lista suja do trabalho escravo. A informação é resultado de um levantamento feito pelo UOL com base na lista divulgada pelo MTE (Ministério do Trabalho e Emprego).

Para um empregador ser incluído na lista, a infração precisa ter sido julgada e é necessário que não haja mais condições para recurso (veja mais abaixo) - 161 nomes de pessoas ou empresas aparecem na relação, divulgada semestralmente pelo MTE. A lista mais recente foi divulgada pelo ministério na última sexta-feira (24).

O MTE resgatou nove pessoas trabalhando em condição análoga à escravidão na fazenda de José Carlos Nobre Monteiro (PCdoB-MA), conhecido como Carlinhos Florêncio. Deputado estadual, ele concorre à reeleição e diz que a inclusão de seu nome na lista foi injusta.

Já Antônio César Pires de Miranda Júnior (Avante-MG), conhecido como Júnior Geloso, é sócio-administrador da Nova Santa Rita Empreendimentos Imobiliários LTDA, que está na lista suja de trabalho escravo desde o ano passado. Ex-prefeito do município de Rio Acima (MG), ele agora tenta uma vaga na Câmara dos Deputados. Júnior não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem (leia mais sobre o posicionamento dos dois candidatos abaixo).

De acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), a legislação atual não proíbe que empregadores condenados administrativamente por trabalho análogo à escravidão disputem eleições.

Fiscais resgataram 9 trabalhadores em fazenda de deputado

Assembleia Legislativa do Maranhão
Carlinhos Florêncio teve seu nome incluído na lista suja do trabalho escravo em 2018

O nome do deputado estadual Carlinhos Florêncio foi incluído na lista suja do trabalho escravo em abril deste ano.

De acordo com o MTE, fiscais encontraram nove pessoas trabalhando em condição análoga à escravidão na fazenda Tremendal, na zona rural do município de Parnarama (a 515 quilômetros de São Luís).

Carlinhos Florêncio tem uma carreira política relativamente bem-sucedida no Maranhão. O reduto eleitoral da sua família é a região de Bacabal, uma das maiores cidades do estado, atualmente governada por seu filho, Florêncio Neto (PHS). Segundo o TSE, o patrimônio declarado de Carlinhos é de R$ 2,4 milhões.

Neste ano, Carlinhos Florêncio tenta o seu terceiro mandato consecutivo como deputado estadual. Em abril, ele deixou o PHS, partido pelo qual foi eleito em 2010 e 2014, para se filiar ao PCdoB, partido do governador e candidato à reeleição Flávio Dino.

Ex-prefeito está na lista suja desde 2017

Reprodução/Facebook/Júnior Geloso
Júnior Geloso (Avante-MG) é sócio de empresa que está na lista suja do trabalho escravo

Júnior Geloso é sócio-administrador da Nova Santa Rita Empreendimentos Imobiliários LTDA, com sede em Rio Acima, município da região metropolitana de Belo Horizonte onde ele foi prefeito entre 2012 e 2015. Seu patrimônio, segundo o TSE, é de R$ 2,99 milhões.

A condição de sócio-administrador da Nova Santa Rita é confirmada pelo Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica da Receita Federal.

A empresa está na lista suja do trabalho escravo desde 2017. Fiscais do MTE encontraram um trabalhador em situação análoga à escravidão na Fazenda do Retiro, no município de Nova Lima, também na região metropolitana de BH.

Esta é a primeira eleição de Júnior para um cargo federal. Em 2008, ele disputou (e perdeu) as eleições para a Prefeitura de Rio Acima.

Em 2012, disputou novamente e venceu. Júnior comandou a prefeitura da cidade por três anos, até deixar o cargo em 2015 para assumir a vice-presidência da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais), a convite do governador e candidato à reeleição Fernando Pimentel (PT-MG).

TSE diz que lei permite candidatos que estão na lista suja

Procurada, a assessoria do TSE informou que não há impedimento legal contra candidatos que estejam com seus nomes incluídos na lista suja do trabalho escravo ou que sejam sócios de empresas que estejam nela.

Segundo o tribunal, a Lei da Ficha Limpa impede apenas pessoas que foram condenadas por órgão colegiado (em geral, decisões de segunda instância).

Como as infrações que levam à inclusão na lista suja são penalidades administrativas, e não judiciais, as pessoas que estão nela não ficam impedidas de disputar cargos eletivos. 

Além de a Lei da Ficha Limpa não conter nenhum impedimento contra empregadores na lista do trabalho escravo, a lei eleitoral também não cobra certidões negativas de dívida trabalhista para os candidatos a cargos eletivos.

Para o coordenador da campanha nacional contra o trabalho escravo organizada pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), Xavier Plassat, candidatos condenados por submeter trabalhadores a situação análoga à escravidão deveriam ser impedidos de disputar as eleições.

"Essas pessoas estão moralmente impedidas de serem eleitas. Elas são, no mínimo, cúmplices com uma atividade que aflige muitas pessoas no Brasil", afirma.

O que dizem os candidatos

O advogado de Carlinhos, Evanilson Pereira dos Santos, disse que a inclusão do nome do deputado estadual na lista suja do trabalho escravo foi injusta. Segundo ele, Carlinhos é proprietário da fazenda em que os trabalhadores foram resgatados, mas não é ele quem administra a propriedade.

"São os irmãos dele que cuidam da fazenda. A fazenda só está no nome dele porque foi herança. Mas todo mundo sabe que quem cuida dela não é ele", afirma.

O advogado diz ainda que Carlinhos está questionando judicialmente a inclusão do seu nome na lista suja e que espera obter uma liminar para sair dela.

"Todas essas questões estão sendo resolvidas. Na Justiça do Trabalho, estamos recorrendo das ações que foram movidas. E também estamos tentando uma liminar para retirar o nome dele da lista", afirmou.

A reportagem do UOL contatou a assessoria de imprensa de Júnior Geloso na última segunda-feira (27) e enviou questionamentos ao candidato. Um novo contato foi feito na terça-feira (28). Por um aplicativo de troca de mensagens, a assessoria informou que responderia as perguntas enviadas, mas, até a última atualização desta matéria, nenhuma resposta foi enviada. 

O que é a lista suja do trabalho escravo

A lista suja do trabalho escravo é uma relação, publicada pelo governo federal, de empresas e pessoas físicas condenadas em caráter administrativo pelo MTE por manter trabalhadores em situação análoga à escravidão. Essa relação é atualizada a cada seis meses. 

A escravidão contemporânea é definida por quatro elementos: trabalho forçado (que também envolve o cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (quando o trabalhador é mantido em um local por conta de dívidas junto ao empregador), condições degradantes de trabalho e jornada exaustiva.

Receba notícias do UOL. É grátis!

UOL Newsletter

Para começar e terminar o dia bem informado.

Quero Receber

Veja também

UOL Cursos Online

Todos os cursos